O Que Dizem Os Releases…
Pudessem eles realmente “falar”, certamente reclamariam muito!
Reivindicariam, sim, maior atenção e, principalmente, um voto de confiança dos seus usuários.
Release, Programação de Materiais, Programas de Entrega ou Embarque, enfim, tantos são os nomes de que se faz uso, apesar de não se utilizar, adequadamente, toda funcionalidade desta ferramenta, de vital importância na cadeia de suprimentos.
Atrasos nas entregas são, por vezes, representados por números positivos, negativos ou, até mesmo, por dízimas periódicas. Entregas podem significar embarques, enquanto que horários tanto podem representar a saída do material da expedição do fornecedor, como a chegada no recebimento da montadora. Essa diversidade de interpretações faz da leitura dos releases uma complicada, mas importante tarefa, principalmente quando a transmissão se dá via EDI, exigindo ginásticas mirabolantes das Softwarehouses, no tratamento dessas mensagens.
Entretanto, a leitura em si não é o maior entrave ao cumprimento dos releases por parte dos fornecedores. A maior barreira está na diversidade de processos de trabalho utilizados pelos fabricantes de autopeças, que buscam adaptar-se às exigências, ainda mais diversificadas e despadronizadas das montadoras.
O propósito de se enviar um programa, especificando quantidades, local, hora, dia e mês, é de que a entrega seja feita conforme pedido. Entretanto, o que aparentemente é tão óbvio e simples pode se transformar num intrincado e perigoso jogo de interesses e prioridades, onde habilidades pessoais, “amizades” ou até a intimidação por pressões verticais acabam prevalecendo, quando regras básicas não são observadas no tratamento do release.
Pode-se aceitar que num mercado tão globalizado e competitivo, como o de autopeças, as montadoras – reconhecidas como pontuais pagadores – tenham que pressionar, brigar e espernear para adquirir suas peças e componentes?
É aí que perguntamos: por que?
Para tentarmos responder, recorreremos a nossa experiência de anos, orientando o treinamento de fornecedores locais e estrangeiros de uma grande montadora:
a) FALTA DE CONHECIMENTO – A maior parte das empresas simplesmente não sabe ler e interpretar o que dizem os releases. Mesmo com os treinamentos e reciclagens realizados pelas montadoras, a tarefa de “ler” os releases, transmitidos via EDI passa, muitas vezes, nas mãos de pessoal pouco familiarizado com o processo: office boy, secretária, digitador, etc. Isso dificulta o treinamento já que essas funções têm grande rotatividade. Comumente, pessoas treinadas deixam seus cargos, não se preocupando em passar, adequadamente, a “receita do bolo” aos seus substitutos.
b) PROCESSOS INADEQUADOS – Cumprindo exigências de Certificados de Qualidade, fabricantes de autopeças investem na instalação de EDI com equipamentos, softwares, linhas de comunicação dedicadas, caixas postais eletrônicas, além dos custos mensais de manutenção. Entretanto, apenas essa parafernália adquirida não os credencia a maximizar o uso dessas ferramentas nas rotinas diárias de abastecimento. Empresas que pouco investem em treinamento, mesmo tendo a sua disposição todo um moderno aparato, acabam concentrando o atendimento dos programas das montadoras nos canais tradicionais, via telefone, gerando stress desnecessário e trabalho adicional nas duas pontas da cadeia.
Além disso, as montadoras, não medindo esforços para evitar parada de linha, alimentam esse procedimento com atitudes paternalistas, que visam muito mais a solucionar o perigo eminente do que disciplinar o fornecedor deficiente, pressionando-o ininterruptamente para priorizar o atendimento de suas necessidades imediatas.
c) FALTA DE PLANEJAMENTO – Absorvidas pelo ritmo emergencial, que elas mesmas acabam criando, muitas empresas fornecedoras de autopeças preferem descartar as informações dos releases, orientando suas entregas a partir dos críticos diários de materiais. Não se planejando conforme as programações, não conseguem definir prioridades, e vão orientar sua produção e setups de máquinas de acordo com as nervosas cobranças dos disponentes. Jogam, assim, por terra todo um planejamento consistente, já que são forçadas a atenderem “da mão para a boca”.
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d) FALTA DE PADRÃO OPERACIONAL – Paridos nos sistemas de gestão de montadoras e sistemistas, processados fora ou dentro do país, a língua aplicada nos releases diverge sobremaneira. Apesar dos esforços de órgãos e comissões reguladoras dos padrões locais – ANFAVEA e SINDIPEÇAS no segmento de autopeças – os “sotaques”, significados e interpretações variam conforme as diversas práticas de negócios trazidas das matrizes, oriundas da Europa, Estados Unidos e Ásia.
e) INSTABILIDADE DOS PROGRAMAS – Pressionadas para responderem, com rapidez, às exigências de um mercado inconstante e sujeito a variáveis políticas e econômicas, as montadoras acabam tendo que revisar constantemente seus programas de materiais. Reagir com a mesma rapidez às reprogramações é a resposta que se espera de toda cadeia de suprimentos. Entretanto, isto nem sempre é factível, pois as ferramentas utilizadas nem sempre possibilitam uma pronta reação, seja por falta de suporte sistêmico, processos de trabalho ou, até, falta de comunicação.
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Ao ignorar o que dizem os releases, dispara-se um tiro pela culatra, pois alimenta-se um perigoso círculo vicioso na cadeia de suprimentos: programas não atendidos acumulam quantidades em atraso, que geram estoques críticos, ocasionando cobranças estressantes, para quantidades em atraso que, de antemão, não poderão ser atendidas, na sua totalidade.
O atraso acumulado passa, então, a ser embarcado em mínimos, com o intuito de evitar parada de linha. Por outro lado, esse mínimo deve ser atualizado pelo disponente, criando um “release paralelo” que gera fretes extras com entregas emergenciais, realimentando o círculo.
Seria, então, o caso de perguntar se não caberia uma re-análise dos impactos dos releases nos processos de abastecimento da empresa, buscando otimização dos recursos disponíveis e tornando o atendimento das expectativas do cliente mais simples e barato?
A resposta não pode ser generalizada, pois há que se considerar os diferentes valores e culturas de cada empresa, seu volume de negócios, seu porte, e, principalmente, sua disposição em desenvolver novas metodologias de negócios que melhor atinjam os objetivos de superar as expectativas dos clientes.
Texto publicado originalmente por João Abinajm em RH Portal
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